A prosperidade colectiva constrói-se alicerçada em instituições económicas endógenas inclusivas, que asseguram os direitos de propriedade, criam condições igualitárias para todos e incentivam investimentos em novas tecnologias e competências, proporcionando, como é natural, maiores chances de crescimento económico. Contrariamente, aquelas instituições, que os autores chamaram de extrativistas, que são estruturadas de modo que poucos se apoderem de recursos de muitos e mostram-se incapazes de proteger os direitos de propriedade, ou prover incentivos para a actividade económica. As instituições políticas inclusivas promovem ampla distribuição de poder político, permitindo a participação plural, proporcionando um elevado grau de centralização política, de modo a estabelecer a lei e a ordem, que são os fundamentos de direitos de propriedade seguros e de uma economia de mercado inclusiva.
A emersão nos aspectos históricos da problemática da pobreza da humanidade, sugerida por Acemoglu e Robinson (2012), fazendo uma descrição histórica sobre a evolução económica e social, desde a revolução neolítica, até aos conturbados dias de extrema pobreza contemporânea em algumas geografias e a prosperidade em outras, em um compêndio sobre economia do desenvolvimento digno de realce "Por que as Nações Fracassam", que foi a minha última leitura do ano de 2024, levou-me a estabelecer o paralelismo e particularizar para a realidade angolana, interrogando-me, o que leva este País, com tantas riquezas no seu subsolo e um clima fantástico, a enfrentar uma situação de pobreza extrema, como a que se assiste? Será que se pode alterar o quadro, orquestrando a prosperidade a partir da base actual de instituições vigentes, de carris absolutistas? Pretendia que este artigo fechasse também o ano das minhas reflexões neste espaço, infelizmente, terminei a leitura já no período de férias. Entretanto, como o ditado popular sugere, vale tarde, do que nunca, e este será o meu artigo de abertura do ano de 2025. Há, no entanto, alguns aspectos que devem ser aflorados previamente, para que se possa entender alguns pressupostos, como o "Consenso de Washington", que já vem de há alguns tempos (anos 1990), em que se inspiram os programas de estabilização económica e ajustamento estrutural do FMI e BM, visando orquestrar a prosperidade, das nações pobres.
O termo Washington Consensus foi proferido pela primeira vez em 1990 por John Williamson. É frequentemente usado como sinónimo do "Neoliberalismo" e "Globalização". O termo é visto como apanágio de uma série de políticas Neoliberais que têm sido impostas aos países pobres, pelas instituições de Bretton Woods, basificadas em Washington, nomeadamente: o FMI e BM e as suas ramificações, neste grupo de países encetaram reformas no sentido de orquestrar a prosperidade, simplesmente corrigindo as deformações estruturais nas contas internas e externas, resumindo-se nas seguintes políticas: a) disciplina fiscal; b) direccionamento das prioridades da despesa pública para as actividades que oferecem simultaneamente alto retorno de rendimento e as potencialidades de distribuição do rendimento, tais como os cuidados de saúde, educação básica e infra-estruturas básicas; c) reforma do sistema de impostos (baixando a taxa marginal de impostos e alargando a base tributaria); d) liberalização das taxas de juros; e) uma taxa de câmbio competitiva; f) liberalização do comércio; g) liberalização dos fluxos de investimento directo estrangeiro (IDE); h) desregulamentação ou (remoção das barreiras de entrada e saída); e i) assegurar os direitos de propriedade.
Tive a oportunidade, no texto publicado a 13 de Agosto de 2024, que intitulei "Por que razões a agro-indústria tende a fracassar em Angola?", de exprimir a minha indignação da forma como a indústria de transformação do tomate de alguns países africanos (Gana, Nigéria, Senegal e outros), foi destruída pelas políticas de liberalização do comércio do Consenso de Washington, sem antes preparar as bases de convergência, criando instituições inclusivas, para que os países pudessem adoptar tecnologias e criar competências, que os permitissem competir, com os outros países, operando em mercados mais competitivos. Mas essencialmente, sem alterar, as instituições extractivas implantadas nesses países, após a descolonização, em vez de criar prosperidade, redundaram no aprofundamento da pobreza. Reformas na base de instituições económicas e políticas que excluem, aqueles que não pertencem aos grupos dominantes que substituíram as elites coloniais, não orquestram a prosperidade, pelo contrário, aprofundam as assimetrias entre as regiões do mesmo país, distanciou ainda mais as pessoas.
Os programas de ajustamento estrutural e estabilização económica do FMI e BM que foram implementados na América Latina e na África Subsaariana, assentes nas reformas descritas acima, perseguindo supostamente a criação de condições de crescimento económico, consequentemente, da criação da prosperidade colectiva, não têm surtido os resultados, que se alegam perseguir. Pois, na verdade, a história mostra que os círculos virtuosos da prosperidade que aconteceram em vários pontos do mundo foram antecedidos, geralmente, pelo amadurecimento das instituições inclusivas e plurais. A história relata exemplos de crescimento que aconteceram por via de instituições políticas e económicas extractivas, mas que ruíram, pois não eram sustentáveis, porque não ocorreu a destruição criativa das instituições antigas e o surgimento de novas, na maior parte das vezes, as instituições extractivas foram substituídas por outras extractivas, como o que aconteceu com as antigas colónias africanas.
O termo "a prosperidade não se orquestra" assemelha-se ao que o Professor Alves da Rocha (2024) referiu no seu livro "Compreender a Angola de Amanhã ...Hoje", ao afirmar que a "diversificação da economia é uma totalidade sociológica", querendo dizer, que a diversificação económica, requer a transformação estrutural de outras componentes sociais, essencialmente: o nível e qualidade da educação (instrução) das pessoas, disponibilidade dos serviços de saúde, a existências de infra-estruturas básicas fundamentais, a produção e disseminação do conhecimento (investigação científica, básica e aplicada), a liberdade de iniciativa, o que por sua vez, implica a participação política plural, que permita que as prioridades e as opções das escolhas públicas, não seja privilégio de meia dúzia de iluminados, evitando o desperdício de recursos, sempre escassos. Em Angola, temos exemplos de sobra de escolhas públicas que não passaram pelo escrutínio de instituições plurais, de que resultou no desperdício de avultados recursos, pois os canais de denúncia, no contexto ou ambiente de instituições totalitárias, não existem mecanismos para descortinar o uso indevido de recursos públicos. Uma das políticas do Consenso de Washington é o alargamento da base tributária, para equilibrar as contas internas. Mas, como se pode alargar a base tributária, sem pessoas com competências para explorar as oportunidades de negócios, assim transformar oportunidades em negócios geradores de emprego e riqueza?
Respondendo à pergunta fundamental do livro, no caso de Angola, porque é que, um país com o potencial que tem, a maioria da sua população vive em situação de pobreza extrema? A resposta está nas instituições políticas e económicas extractivas, prevalentes desde a antiguidade do poder tradicional (disperso por pequenos reinos), descentralizado exercido autocraticamente pelos seus súbditos. Seguiu-se a tutela do regime colonial português, igualmente despótico e patrial, excluindo os povos autóctones, enveredando pela exploração das suas riquezas, limitando o acesso à educação e ao direito da propriedade; seguiu-se depois o regime extractivo, totalitário do pós-independência, que se concentrou na exploração dos recursos naturais e a sua distribuição a uma elite política, de que resulta o actual estado de pobreza, que não se vai alterar com os programas de inspiração do Consenso de Washington, de que já foram aplicados dois programas ((Programa Stand-by-Agreement (SBA) e Programa de Financiamento Ampliado (EFF, na sigla em inglês)) que não alteram o stutus quo (ver o meu artigo publicado no dia 29 de Agosto de 2023, com o título: O Déjá vu da instabilidade macroeconómica Angolana) .
O livro traz um exemplo de sucesso de orquestração de prosperidade, que não passou pelas receitas uniformes do FMI e BM, muito próximo dos angolanos, que é a história do Brasil, que passou por várias vicissitudes, talvez ainda passe, mas têm conseguido superar as adversidades de desenvolvimento. O Brasil tirou mais de 20 milhões de cidadãos da situação de pobreza extrema. As instituições políticas plurais do poder local, cada vez mais participam da solução dos problemas locais, conseguiram destituir dois Presidentes acusados de comportamentos contra a lei fundamental do país. O Brasil é hoje a 8.ª economia do mundo, pertence aos BRICS, que se coloca na posição de fazer face ao grupo dos países mais ricos do mundo, contribuindo, desta feita, para a alteração da nova ordem económica mundial, em vez do unilateralismo, que se vem assistindo. Efectivamente, a prosperidade não se orquestra, constrói-se ao longo do tempo, na base de instituições políticas e económicas inclusivas! Quo Vadis, Angola!
Bibliografia consultada
Acemoglu, Daron; James, Robinson (2012). Por que as Nações Fracassam. Tradução de Cristina Lopes, Rio de Janeiro, Brasil;
Alves da Rocha, Jose Manuel, (2024). Compreender a Angola de Amanhã ...Hoje, Universidade Católica de Angola, Luanda.
Williamson, John (2004), Washington Consensus. Institute for International Economics, Washington.
Malumbu, Moisés (2005). Os Ovimbundu de Angola: tradição, economia e cultura organizativa, Edizione Vivere In, Roma.